segunda-feira, 15 de março de 2010

Manuel Caldas junta Poe e Doré em O Corvo


Ao contrário do que é habitual neste espaço, dedicado à Banda Desenhada, o livro que motiva este texto, embora publicado por uma editora que se tem dedicado a recuperar clássicos da Banda Desenhada, a Librimpressi, de Manuel Caldas, não é BD. É um poema de um grande escritor americano, traduzido por um dos nossos melhores poetas, ilustrado por um mestre da gravura.
O grande escritor é o mestre do fantástico e do macabro, Edgar Alan Poe, a tradução é de Fernando Pessoa e as gravuras são de Gustavo Doré. Três grandes nomes, reunidos numa cuidada edição, com o rigor a que Manuel Caldas nos habituou.
Se os contos de Poe já têm sido adaptados aos mais diversos suportes, do cinema à Banda Desenhada, no caso concreto do poema “The Raven”, encontramos adaptações ao teatro, ao cinema, à música, à animação e à Banda Desenhada. Do filme homónimo de Roger Corman (muito vagamente inspirado pelo poema), a músicas de Lou Reed e dos Alan Parsons Project, passando por séries de televisão como os Simpsons, a “Vincent”, o primeiro filme de Tim Burton, com narração de Vincent Price, que recita parte do poema, até às adaptações à BD feitas por Richard Corben, primeiro no livro Tales of Edgar Alan Poe e depois na mini-série “Haunt of Horror: Edgar Alan Poe”, são inúmeras as homenagens ao poema de Poe, mas nenhuma ultrapassa a força do texto original, acompanhado pelas ilustrações de Gustavo Doré, notável pintor e ilustrador francês, cujas ilustrações acompanharam alguns dos maiores textos da literatura mundial, da Bíblia, à “Divina Comédia” de Dante, passando pelo “Dom Quixote” de Cervantes, até “The Rime of the Ancient Mariner”, de Samuel Taylor Coleridge, ou “Paradise Lost”, de Milton.
Último trabalho de Doré, que morreu antes de ser publicada a edição de “O Corvo” com as suas ilustrações, esta obra revela um Doré com um traço mais expressionista e perfeitamente adequado ao ambiente opressivo do poema, que devia ser bastante próximo do estado de espírito do próprio Doré, a braços com uma depressão que se viria a revelar fatal.

Publicada simultaneamente em Portugal e Espanha, numa versão trilingue, em que o texto original em inglês, surge acompanhado pela tradução portuguesa de Fernando Pessoa e pela tradução castelhana do poeta venezuelano Juan António Pérez Bonalde, esta edição de Manuel Caldas, tendo em conta a qualidade da impressão, o prestígio dos autores e o preço acessível, tem tudo para ser um sucesso.
Esperemos que assim seja e que o sucesso comercial de “O Corvo” permita a Manuel Caldas continuar com o seu trabalho na recuperação dos clássicos da Banda Desenhada.
(“O Corvo”, de Edgar Alan Poe e Gustavo Doré, Librimpressi, 64 pags, 13,00 €)
Texto originalmente publicado no Diário As Beiras de 13/03/2010
PS - Como sou simpático, e os visitantes deste blog merecem, além do poema de Poe lido por Christopher Walken, aqui vai também, graças ao mundo maravilhoso do You Tube, o filme Vincent, primeiro filme de Tim Burton, narrado pela voz única do grande Vincent Price, cujo nome ficou para sempre ligado ao de Poe, graças aos filmes realizados por Roger Corman que Price protagonizou.

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